LUDMILLA FERES FARIA
Eis aqui o Almanaque, o 19º de nossa série. Nossos textos foram cuidadosamente selecionados pelos integrantes da equipe de publicação desta revista eletrônica do IPSM-MG, a partir dos movimentos do Campo Freudiano. Neste número, você, leitor, encontrará material sobre o tema do XI Congresso Mundial de Psicanálise, “As psicoses ordinárias e as outras, sob transferência”, e sobre o tema do VIII Encontro Americano de Psicanálise de Orientação Lacaniana (ENAPOL) “Assuntos de família, seus enredos na prática”. Acreditamos que a fluidez da internet possibilite que essas discussões reverberem e provoquem a participação de vários.
Na rubrica Trilhamentos, três autores abordam de forma clara e instigante as mudanças introduzidas na clínica psicanalítica a partir da construção do sintagma psicose ordinária, por Jacques Alain-Miller, nos anos 90. Iniciamos com o texto “Psicoses, ordenadas sob transferência”, de Miquel Bassols – atual presidente da Associação Mundial de Psicanálise –, no qual se questiona a forma discreta e dispersa com que as psicoses ordinárias se revelam, desfazendo as fronteiras e impossibilitando a construção de um mapa geral, o que poderia acabar por fazer evaporar essa categoria “precisamente pela extensão e efetividade deste uso”. Para avançar nessa discussão, o texto “Clínica lacaniana da psicose”, de Angelina Harari, atual vice-presidente da AMP, traça um percurso cuidadoso pela obra de Lacan, no tocante à psicose, demonstrando os fundamentos do que se passou entre a marca estruturalista recebida de Clérambault até a clínica universal do delírio. Yves Vanderveken, por sua vez, abordará no texto “Em direção a uma generalização da clínica dos signos discretos” as consequências desse sintagma para a direção do tratamento na clínica contemporânea.
Não deixe de ler! Você será fisgado pela tensão que se apresenta nos três textos em torno do tema das psicoses ordinárias. O Almanaque, em sua busca por tornar-se uma das referências sobre os temas discutidos nos espaços do IPSM-MG, passou a incluir, a partir deste número, uma bibliografia de textos sobre o tema a ser trabalhado.
Para saber sobre o que surge de novo em termos da psicose na prática cotidiana dos hospitais psiquiátricos, a equipe do Almanaque foi conversar com Juliana Motta, gerente tecno-assistencial do Instituto Raul Soares, que, na entrevista “Do confinamento ao manejo clinico”, resgata a história dos hospitais psiquiátricos de Minas Gerais e as mudanças ocorridas nesses espaços a partir da reforma psiquiátrica. A entrevistada deu destaque à importância da presença dos analistas de orientação lacaniana na construção desses espaços. É surpreendente a forma como essa articulação se mantém viva até os dias de hoje, em especial na parceria com o IPSM-MG, que, como ela nos lembra, foi celebrada a partir de um convênio entre as duas instituições no início deste semestre.
A psicose é também o mote do trabalho de Lacadée – “O escabelo de François Augiéras: escritura e pintura do corpo do de-lito (de-leito)” –, na rubrica Encontros, sobre o escritor e artista François Augiéras, que encontra em suas criações um lugar para abrigar sua “solidão extrema” e sua “crueldade de vida”.
Em Incursões, contamos com os textos produzidos nos espaços de pesquisas do IPSM-MG sobre o tema sobre a família contemporânea. No texto “A família contemporânea e o real do sexo”, Suzana Barroso questiona as consequências do que seria a “educação sem gênero” para a constituição subjetiva. Seguindo a autora, podemos perguntar qual seria a repercussão sobre o “ser-para-o-sexo” (LACAN, 1968/2003, p.363) dessa extrema liberdade concedida às crianças quanto à escolha do sexo. Pergunta essa de grande relevância para o momento atual e também para a investigação da XXI Jornada de EBP-MG, “O inconsciente e a diferença sexual : o que há de novo?”. Lúcia Mello, por sua vez, interroga se as transformações culturais e sociais que incidiram sobre os discursos atingiram o que Freud formulou como a lei primordial da humanidade: o tabu do incesto. Já Mariana Vidigal aborda o tema da família no texto “Os filhos de toxicômanos”, no qual procura questionar as respostas universais dadas por algumas políticas públicas no que diz respeito ao afastamento das crianças de seus pais quando estes são usuários de droga. Vidigal não deixa de destacar que a relação toxicômana com a droga pode provocar efeitos nefastos para os sujeitos, e que por isso mesmo elas devem ser tomadas no singular. Esses três textos, somados ao texto de Cassandra Dias, “Assuntos de família no discurso toxicomaníaco: impasses”, apresentam as consequências subjetivas advindas das mudanças no núcleo familiar. Para além do debate que ocorrerá em Buenos Aires, convidamos o leitor a ler esses textos, assim como “The Wolfpack: entre filmes e lobos”, considerando não apenas o viés clínico, mas também o viés político encontrado nas presentes elaborações.
Para finalizar, temos os textos apresentados por Magda Casarotti e Nubia Ferreira de Melo na última Jornada do IPSM-MG, cujo cuidado e rigor teórico na escrita nos permitem finalizar esta publicação recolhendo os efeitos que o curso de formação do IPSM-MG tem provocado em seus alunos.
Esperamos que o leitor encontre, nesta edição, referências que o convide a participar de nossos espaços de investigação e a nos remeter, também, suas produções e contribuições para nossas próximas publicações.
Desejamos-lhe uma ótima leitura!