DOMENICO CONSENZA
FOTO: DURAMADRE, “UM CORPO INEVITAVELMENTE INTERCONECTADO”. SEBASTIÁN ARPESELLA.
A Adolescência, Momento De Crise?
Atualmente, a ideia da adolescência como momento de crise estruturante na experiência do sujeito é questionada. O debate interroga tanto a dimensão de corte, de descontinuidade em relação à experiência infantil, quanto o alcance emancipador e separador para o jovem do modo de construção do laço com seus pais. Segundo diversos autores do campo da sociologia e da psicologia, é particularmente a adolescência, em nossa época, que torna problemática a noção de crise da adolescência. O modo de vida dos adolescentes de hoje colocaria em evidência um “analfabetismo introspectivo” (FRANCESCONI, 2004, p. 168), “um hedonismo moderado”, um conformismo e um pacifismo que não combinam com a imagem codificada do jovem rebelde, contestatório, da tradição. Nessa perspectiva, a leitura psicanalítica da passagem à adolescência tende a ser reconduzida a uma variante contemporânea da representação romântica do processo de formação do jovem, reduzido a um mito: a adolescência como Sturm und Drang (OFFER, D. e SHONERT-REICHL K. A, 1992), tempestade e ímpeto, cuja leitura freudiana em termos de remanejamento da economia pulsional não seria senão uma sutil reformulação no campo clínico.
Além da apreciação que podemos dar a essa leitura, o que é importante é a questão que pode resultar para os psicanalistas quanto ao estatuto da adolescência e aos efeitos da transformação que as mudanças histórico-sociais podem produzir nela.O que acontece, de fato, com a adolescência na época do Outro que não existe? Como os adolescentes de hoje regulam o encontro com o real do sexo e da morte? Isso, enquanto a operação de interdição e de véu sustentada pela função paterna, mostra, neste momento de nossa civilização, os sinais de um declínio progressivo. Como é que eles se organizam nesse encontro com o real sem poder contar, em certos casos, com a relação estruturante do Nome-do-Pai, com sua função de orientação do Ideal do eu e com sua ação de regulação humanizante do gozo? Como é que eles iniciam um movimento de separação, quando é o próprio Outro social que lhes ordena a gozar sem limite, isto é, a não se separar? Esta é, de fato, uma questão que pertence ao registro ético e clínico que o nó da adolescência contemporânea traz hoje para nós.
A Sexualidade Na Adolescência:
Da Passagem Da Puberdade À Iniciação Sexual
O problema se situa na relação do adolescente contemporâneo com a sexualidade como pedra angular de seu desenvolvimento. Com o real do sexo no auge da passagem da puberdade, Freud colocou a questão essencial à qual o sujeito adolescente procura responder. Nesse sentido, a adolescência se apresenta para a psicanálise, segundo a fórmula eficaz de Alexandre Stevens, como “sintoma da puberdade” (STEVENS, 2004, p. 28). Trata-se, para o sujeito adolescente, de situar-se numa posição desejante que lhe seja própria em relação ao despertar pulsional que atravessa o seu corpo durante a puberdade. À esta exigência responde ativamente, após a passagem da puberdade – aquela do ciclo menstrual para a menina e da ejaculação para o menino –, o tempo lógico da iniciação sexual para o adolescente. Ele é então introduzido no encontro com o gozo na relação com outro sexo, que lhe dá abertura à experiência e à questão da relação sexual.
Em seu prefácio a “O despertar da primavera”, de Wedekind, Lacan formula dois tempos essenciais desse processo, que subtraem a experiência do adolescente de um linearismo psicológico gradual, que faria da iniciação sexual o tempo de realização necessário para a passagem da puberdade à adolescência. Antes de tudo, ele introduz a eminência do inconsciente do sujeito como dimensão que, através do sonho, encena a relação sexual do adolescente com o parceiro: “sem o despertar de seus sonhos” (LACAN, 2003, p. 557), os meninos não se preocupariam com o que significa para eles fazer amor com as meninas, escreve Lacan. O enigma que constitui o inconsciente do sujeito entra assim em jogo, em pleno processo de iniciação sexual do adolescente. No fundo, é um primeiro tempo lógico desse processo: a elevação da relação sexual ao nível do inconsciente, que o faz existir para o sujeito numa representação singular, imaginária, como enigma, num quadro fantasmático ou que dá lugar à fantasia. O primeiro tempo é então aquele em que, para o adolescente, há relação sexual, que é representável numa cena que o inclui. Em segundo lugar, Lacan esclarece em que consiste o nó real que uma tal experiência iniciática revela ao adolescente, definindo-o como verdadeiro princípio da iniciação: “Que o véu levantado [sobre o mistério da sexualidade] não mostra nada” (Ibidem, p. 562). Outra maneira de dizer que “a sexualidade [faz] buraco no real” (Idem). Nós podemos situar aqui o segundo tempo lógico do processo de iniciação sexual na adolescência: aquele no qual o jovem adolescente encontra, em suas primeiras vicissitudes da vida sexual com seus parceiros, a inexistência estrutural da relação sexual como experiência que faz trauma para ele.
É esse segundo tempo durante o qual o adolescente experimenta que na relação sexual o gozo é irredutível e não faz relação. Esse tempo de “não há relação sexual” está ligado, estruturalmente, ao primeiro tempo, durante o qual, ao contrário, a relação sexual existe, é representável para o sujeito e funciona como um véu inconsciente do buraco da não relação. É exatamente nessa tensão dialética entre o que leva o adolescente a fazer existir a relação sexual (T1) e o encontro traumático com sua inexistência (T2), entre o tempo do véu e o tempo do trauma, que se estrutura a iniciação sexual do adolescente.
Há Iniciação Sexual Do Adolescente Contemporâneo?
Não há como não sentir a perda do véu em torno do enigma da sexualidade na relação do adolescente contemporâneo com o sexo. Lacan (2001) sublinha isso, apontando a dimensão pública do levantamento do véu, no mundo atual, em torno da questão da puberdade. O efeito de uma tal operação que anda junto com o declínio da função paterna pode ser identificado, tal como observou Gilles Lipovetsky (2007) – citado num artigo de Serge Cottet (2006) –, no “desencantamento do sexo” (COTTET, 2006, p. 71) pela banalização da liberdade sexual (Idem), na “indiferença” (LIPOVETSKY, 2005, p. 53) e na “apatia” (Idem) amorosa da maioria dos adolescentes contemporâneos. Essa dificuldade para que o sexo faça enigma para o adolescente contemporâneo testemunha um impasse no processo de sintomatização da própria puberdade, aposta fundamental para a psicanálise na experiência da adolescência.
Nós podemos situar, antes de tudo, uma dificuldade do adolescente contemporâneo em se colocar no tempo T1 da iniciação sexual, isto é, no encontro do sujeito com o sexo como enigma inconsciente representável numa “Outra cena”. O primeiro nível de dificuldade para o adolescente de hoje consiste em fazer existir a relação sexual, fazer existir um Outro do Outro, num mundo que se caracteriza por um fechamento substancial – quando não é uma rejeição – do inconsciente, condição que não permite ao sexo adquirir para o sujeito um valor enigmático. Mas em segundo lugar, essa ausência de estruturação do sexo como representação inconsciente traz prejuízos ao modo de encontro, para o adolescente, do tempo T2, aquele da iniciação como trauma da inexistência do Outro do Outro. De fato, como sublinha Jacques-Alain Miller (2005), sem véu, sem ideal, não há trauma subjetivável.
Como é que o adolescente pode realizar sua vida com sua própria iniciação subjetiva nas condições atuais, em que a inexistência da relação sexual, a ausência de um Outro que funcione como garantia se apresenta como um dado que se propaga socialmente como uma verdade consubstancial ao niilismo de hoje?
Os supostos distúrbios de conduta na adolescência, as práticas compulsivas caracterizadas por frequentes passagens ao ato, típicas da adolescência, e mais ainda, na adolescência contemporânea, apresentam-se, sugere Phillipe Lacadée (2011), como fracassos e alternativas ao processo de estruturação de um sintoma no sentido freudiano do termo, impasse no trabalho de nomeação do real inominável. Para o adolescente, esses distúrbios podem, entretanto, em muitos casos, se revestir de um valor paradoxal, aquele de uma tentativa desesperada de fazer existir a relação sexual para construir um Outro do Outro e encontrar uma via de acesso à sexualidade. Cabe ao analista permitir aos adolescentes colocar em palavras essa função incluída nos seus atos desregrados, condição preliminar para uma subjetivação. E de levá-los a transformar seu sintoma em elemento não generalizável, mas, ao contrário, fantasmatizável.
O problema dos adolescentes de hoje quanto ao sexo se apresenta então como invertido em relação às épocas anteriores. De fato, não se trata para eles de conseguir inicialmente levantar o véu que envolve o mistério do sexo depois de tê-lo construído inconscientemente. Mas trata-se, antes de tudo, de introduzir um véu, de permitir a realização de uma fantasmatização que limite e torne suportável a errância do jovem adolescente exposto, sem mediação alguma, ao objeto inominável que está em jogo na relação entre os sexos. É somente assim que se tornará possível, através do trabalho de nomeação, aproximar a inexistência da relação sexual como trauma subjetivável, preservando-se, assim, de recair nas derivas do sem-limite próprio da adolescência contemporânea.
Traduzido do italiano por René Fiori com a colaboração de Monique Dellius.