LUDMILLA FERES FARIA
Está no ar o Almanaque 16! Este número introduz algo novo: a publicação orientada pelo tema da adolescência. Para tratar desse assunto, partimos da intervenção de Jacques-Alain Miller no encerramento da 3ª Jornada do Instituto da Criança, Rumo à adolescência, publicada em nosso portal Minas com Lacan, que tanto entusiasmou a comunidade dos analistas a seguir interrogando: “o que é a adolescência?”. Para trabalhá-lo, abrimos mão, neste número, da política de sermos uma publicação das produções advindas das várias atividades do Instituto para dar lugar aos trabalhos de colegas de diversas Escolas do Campo freudiano, dentre os quais se encontram alguns dos que foram citados no referido texto de Miller e no comentário de Ana Lydia Santiago, na Sede da EBP-MG, publicado no Correiro 77 e no CIEN-Digital 19.
Dessa forma, a maioria dos textos dessa edição foi cuidadosamente escolhida pela equipe entre os publicados na revista internacional de psicanálise Mental, nº 23, de cujo tema “Qual o futuro para a adolescência?” vocês aqui encontrarão ecos e tentativas de respostas que são abordadas de forma contundente a partir da articulação entre a prática clínica e a teoria. Nossa expectativa é de que esse número sirva de incentivo para incrementarmos nossas pesquisas em torno do tema da adolescência, que, como já foi anunciado, será também o tema da próxima jornada da EBP-MG: “jovens.com: corpos e linguagens”.
Abrimos nossa edição, em Trilhamentos, com os textos de Philippe La Sagna, “A adolescência prolongada, ontem, hoje e amanhã”, e de Domenico Consenza, “A iniciação na adolescência: entre mito e estrutura”, nos quais os autores interrogam sobre quais os efeitos advindos da mudança no estatuto do Outro sobre o tempo da adolescência. La Sagna serve-se dos estudos do antropólogo Paul Yonnet para abordar a forma como a incidência do real da ciência afeta, de forma não homogênea, a relação dos jovens com o tempo: “hoje nada mais é para sempre”. Consenza, por sua vez, evidencia a importância ética de retomarmos a questão do tempo a partir da proposta de Lacan: “de que forma os adolescentes iniciam um movimento de separação, quando o próprio Outro social lhes ordena gozar sem limite?”, pergunta que serve de mote para seu trabalho.
Em Incursões, agrupamos as questões da adolescência abordadas pelo viés do vivo da clínica. Os três autores, Laure Naveau, com “Solidão do ser falante”, Hélène Deltombe, com “Sair da adolescência” e Pierre Naveau, sob o título “O sintoma na encruzilhada dos caminhos: um caso extremo de recusa”, apresentam as manobras necessárias num tratamento analítico quando o sujeito adolescente é invadido pela recusa ao Outro, que pode apresentar-se tanto pelo uso excessivo das drogas pesadas quanto pela vontade irredutível de morte. A fineza clínica presente nesses depoimentos com certeza será de grande interesse para nossas reflexões.
Os amantes da literatura infanto-juvenil não podem deixar de ler na rubrica Encontros o texto “A adolescência como abertura do possível”, de Marco Focchi, que aborda a função dos semblantes na adolescência a partir de clássicos como A linha da sombra, de Joseph Conrad, Os indiferentes, de Albert Moravia, e O jovem Törless, de Robert Musil, entre outros. Tais leituras demostram a passagem de uma sociedade na qual a saída da adolescência estava calcada nos ritos de iniciação, com forte presença do Outro, para uma sociedade, na qual o jovem necessita saber encontrar sozinho uma solução perante os riscos, tal qual na história infantil Aventuras de Pinóquio. Nessa história, a transformação de boneco de madeira em “menino de verdade” só ocorre após Pinóquio conseguir salvar ele e o pai de serem engolidos pela imensa baleia. Vilma Coccoz também serve-se da literatura juvenil para apresentar em seu texto “A clínica dos adolescentes: entradas e saídas do túnel” a função do analista na clínica com os adolescentes e a importância do manejo da transferência com as questões apresentadas pelas famílias.
Em De uma nova geração, encontramos os textos de dois alunos do Curso de Psicanálise do IPSM-MG, “Dora e as ‘maridas’: duas tentativas de abordar o feminino a partir do amor ao pai”, de Maria Amélia Tostes, e “Da solução do sintoma ao sinthoma como solução”, de Leandro Marques Santos. Enquanto no primeiro o enfoque é colocado sobre a participação do pai na busca de resposta para eterna pergunta feminina: “o que é uma mulher?”, o segundo aborda, a partir de testemunhos do passe, os destinos do sintoma desde o início de uma análise até o seu ponto máximo, quando o sujeito se encontra com o real de seu sinthoma.
E, ainda, lembrando que o analista de orientação lacaniana mantém-se atento às questões de sua época e busca participar dos debates da cidade nos vários campos do saber, não poderíamos deixar de registrar o movimento histórico vivido pela juventude paulista nos últimos meses de 2015. Quando uma leitura convencional apostava no niilismo e na apatia juvenil, o Brasil foi sacudido, em nossa megalópole, pelo Movimento Secundarista, no qual os jovens tomaram a palavra e a cidade para reivindicar o direito a estudar. O Almanaque não poderia ficar longe desse debate e quis saber com detalhes a forma como os jovens se organizaram para barrar a reorganização das escolas estaduais de São Paulo e também se interessou por como esses jovens foram tocados por esse movimento. Essa conversa, em primeira mão, vocês podem ler na rubrica Entrevista. Verão com que vivacidade os jovens souberam não recuar perante o impasse imposto pelo Outro e como fizeram isso sem perder a alegria.
Para compor esse número do Almanaque, contamos também com a preciosa participação de alguns jovens de nossa cidade que gentilmente nos cederam fotos, desenhos e grafites e deram, assim, mais vida e cor à nossa publicação. A eles, nosso imenso agradecimento. Não deixem de conferir!
Este número, produzido pela nova equipe de publicação, marca a transição da Diretoria de publicações e temos como responsabilidade o desafio de manter o Almanaque como um veículo de transmissão da psicanálise de orientação lacaniana e do que circula no Instituto de Psicanalise e Saúde Mental de Minas Gerais. Nossa aposta é a de estarmos à altura do convite feito pela atual diretora do IPSM-MG, Ana Lydia Santiago, e do que nos foi transmitido pela diretora de publicação “sainte”, Márcia de Souza Mezêncio.
Com vocês, o Almanaque 16!