Ludmila Féres Faria
Voilá! Chegamos à 24ª edição da revista Almanaque On-line, que tem a religião como tema principal. O mote da escolha foi a constatação do crescimento das igrejas evangélicas no Brasil — que, segundo o IBGE, terá uma população maior que a católica em 2030 — e, em especial, do uso crescente da religião em assuntos do Estado — na maioria das vezes, com um uso segregatório. Tais fenômenos vão ao encontro da afirmação de Lacan durante uma entrevista dada em Roma, em outubro de 1974, sobre o futuro da religião. Nela, o psicanalista francês afirma que a religião triunfará e acrescenta: “não apenas triunfará sobre a psicanálise, triunfará sobre muitas outras coisas também. É impossível imaginar quão poderosa é a religião”. Os desdobramentos dessa afirmação podem ser encontrados neste número da revista do Instituto de Psicanálise e Saúde Mental de Minas Gerais.
Em Trilhamentos, no texto “Uma época fundamentalmente descrente”, Dalila Arpin distingue descrença de incredulidade, e mesmo de ateísmo, para mostrar que a descrença — a falta de uma crença ordenadora — dos dias atuais leva ao surgimento de sujeitos que demandam certezas. Em “Glosa sobre uma bússola”, Antonio di Ciaccia questiona a relação entre o sujeito e o Outro a partir da distinção entre duas bússolas humanas do homem religioso: a crença e a fé. Os dois autores procuram esclarecer a posição do psicanalista nessa seara.
Os entrevistados deste número são Marie-Hélène Brousse e Frei Betto. Brousse, de forma clara, como é seu estilo, esclarece que, embora a psicanálise não seja uma antirreligião, o psicanalista pode ler a religião como uma escolha sintomática. Um vício legal. Em seguida, a Almanaque pôde escutar a leitura de Frei Betto sobre o momento atual da religião do Brasil, por exemplo, sobre as consequências do que ele próprio chamou do “confessionalização da política”. Não deixem de ler.
Ainda sobre o tema da religião, o texto “Crença e Nome-do-Pai” de Alessandra Thomaz Rocha, em Incursões, trata da relação entre crença e Nome-do-Pai buscando elucidar a proximidade e a intimidade entre eles. Evidencia de que maneira ambos tocam a questão do saber e da autoridade, bem como a questão da verdade e da ficção e como se diferenciam.
Na rubrica Encontros, contamos com os trabalhos apresentados nos Núcleos de Pesquisa do IPSM-MG — todos sobre o tema da XXIII Jornada da Seção Minas da EBP, “O tempo na experiência analítica”. O texto de Guilherme Ribeiro, “O tempo e o inconsciente”, aborda as relações entre o tempo das sessões analíticas e o inconsciente. Fernando Casula parte do conceito lacaniano de “inconsciente a céu aberto” para elucidar a incidência do tempo, nesse inconsciente, que está descoberto da metáfora paterna, enquanto Cláudia Maria Generoso privilegia, em seu texto “A temporalidade do inconsciente na clínica das toxicomanias”, o questionamento da relação entre a passagem ao ato, o acting-out e a iteração do Um sozinho.
As contribuições de Fernanda do Valle, em “A solidão e o isolamento nas psicoses”, e de Kelen Cristina Silva, “Psicanálise nas instituições: relato de experiência PAI- PJ do Tribunal de Justiça de Minas Gerais” são encontradas na rubrica De uma nova Geração, com a qual fechamos este número do Almanaque.
Mais uma vez, a equipe de publicação do IPSM-MG buscou escolher textos e imagens que despertem o desejo de trabalho em cada leitor. Agradecemos aos autores que enviaram seus textos e, em especial, aos artistas que nos cederam suas lindas imagens para deixar este número ainda mais rico.
Boa leitura!